domingo, 19 de fevereiro de 2012

NÃO FOI NO GRITO - 029





O CORREIO BRAZILIENSE e a
CONFEDERAÇÃO dos TAMOIOS.


Fig. 01 – A estadia de HANS STADEN (1525-1579), no meio dos ameríndios no Brasil, coincidiu com a CONFEDERAÇÂO dos TAMOIOS  (1554 e 1567). Uma das imagens da sua OBRA mostra a movimentação de um grupo indígena ao redor dele subjugado e a preparação do pescado num moquém

Certamente o CORREIO BRAZILENSE “NÃO FOI NO GRITO” proveniente das profundezas históricas da CONFEDERAÇÂO dos TAMOIOS. Bem ao contrário. O CORREIO silenciou completamente, entre 1810- 1822, o levante dos ameríndios brasileiros ocorrido no Brasil entre os anos de 1560 e 1575, portanto 230 anos antes. Como  o autor do periódico também nunca abriu as suas páginas para noticiar a situação dos primitivos habitantes da Américas. Ou considerar ou qualquer projeto para eles ou para avaliar eventuais conquistas deles ao longo da era colonial brasileira. Mesmo o fato de eles conquistarem, a duras e prolongadas penas,  a isenção do regime da escravidão legal.
Fig. 02 – Retrato de HIPOLITO JOSÉ DA COSTA
De outra parte não há noticia que algum indígena brasileiro fosse destinatário e / ou leitor do Correio Braziliense, ou que desejasse conhecer o que nele se publicava em Londres.
O autor deste blog problematiza este silêncio recíproco. Em primeiro lugar onde existe um silencio, também existe um problema a ocultar. Em segundo lugar este vazio - e este problema -  aponta um grande e rico manancial a investigar. Em terceiro lugar este silêncio revela a urgência e a importância que o autor de Correio conferia a outros projetos. Entre estes outros projetos estava a representação de um sujeito imaginado que tentava passar ao seu leitor. Este sujeito imaginado consumia toda a tinta, o papel e os seus esforços para que o destinatário do seu jornal  entendesse seu projeto central. 


ECKHOUT Albert - Dança dos Tapuias
Fig. 03 – Nesta imagem do INDIO BRASILEIRO visto  e registrado pelos HOLANDESES, meio século após a Confederação dos Tamoios

A CONFEDERAÇÂO dos TAMOIOS, ou “os velhos  de terra” faz pensar  nas atribuições de um senado Romano. O termo “senado” procede do latim “Senex”, significando “homem velho”. Senado significa, portanto, literalmente, “conselho de homens velhos”. Evidente que a idéia não estava madura. Gerações de “antigos da terra” havia devorado em rituais antropofágicos os valentes da tribos inimigas. Tribos inimigas e juradas de morte, queriam, de repente se confederar. Apesar das tentativas nesta confederação, isto era impossível de um momento para outro. Impossibilidade interna e externa graças à força , perspicácia, decisão inabalável e equipamentos dos inimigos externos. A passagem da cultura do caçador nômade face ao agricultor sedentário não constitui nenhum passo de mágica.  Os territórios de caça eram coletivos da tribo. Esta mentalidade isente do sentido de posse individual enfrentavam-se com a mentalidade do agricultor sedentário com posse uni familiar e individualizada. Este confronto não terminou, pois as nações e as reservas indígenas continua a praticar esta posse coletiva
É impossível imaginar que Hipólito José da Costa - nascido na Colônia de Sacramento e educação realizada em Porto Alegre -  desconhecesse e soubesse nada do primitivo habitante do Brasil. Colônia que fora trocada com  a Coroa de Castela pela posse das terras das Missões


Fig. 04 – A multiplicidade dos agentes e dos interesses em jogo neste contato entre os divididos ANTIGOS da TERRA e os não menos divididos europeus é visível nesta imagem e mapa com os nomes dos territórios  em aguerridas e vitais disputas. Certamente os ruídos e gritos guerreiro não chegaram e nem mais interessavam aos ouvidos e aos interesses do Editor do Correio Braziliense e as seus leitores.

O Iluminismo europeu não foi algo monolítico e sem contradições. A questão do indígena americano recebeu as mais ardentes defesas de um Rousseau. Outros deram-se conta, na direção contrária, que este primitivo idealizado era um iletrado vivendo a pré-história no atual território do Brasil. Para “corrigir” este bárbaro era necessário reduzi-lo, dominá-lo e fazê-lo trabalhar no âmbito da nova era industrial que despontava nos centros hegemônicos da Europa.
A contradição entre estas duas concepções era expressa pelo vice-reinado ainda instalado em Salvador por meio de um Diretório ainda em 1758 e coerente com corte lusitana de Lisboa. De um lado reconhecia no primeiro parágrafo definia, como o ideal... o “governo” dos próprios índios através dos “principais”. No contraditório privava os índios   da língua avanhenga e tomava todas as providências para que ela fosse banida .

Isto apesar de o bandeirante ser filho de português e mãe indígena. Esta mãe havia ensinado a língua geral da terra e a preparação dos alimentos nativos da região como a mandioca, o milho e as carnes da caça e pesca preparando o filho para se comunicar com toda a população e passar anos nas suas “bandeiras” conquistadoras. A hegemonia de uma língua decorre da força política de uma parcela dominante.
O governo de Portugal imantou-se pelas luzes deste projeto, no âmbito da colônia brasileira. Ali o governo lusitano uniu-se, ao seu mais figadal inimigo ibérico. Juntos financiaram uma custosa campanha militar para exterminar as Reduções. Esta campanha foi descrita, por cima e por fora, por seus intelectuais num típico discurso em Prosa e Verso. Entre os versos encontra-se o poema “URAGUAI” (1769) de José Basílio GAMA (1741-1795). Tentavam projetar as suas glórias para a eternidade. Glórias que imaginavam incontestáveis, únicas e definitivas. Todo o CORREIO BRAZILIENSE parece ser um corolário deste projeto inacabado iluminista. Projeto que sempre corre o risco de surgir alguém qualificado para apontar as contradições que lhe são imanentes. O primitivo habitante do Brasil era matéria a ser silenciada, ocultada e sem lugar neste projeto como continuam ainda em 2012.


Fig. 05 – Os antigos castelos medievais europeus encontraram semelhança no Brasil as aldeias dos silvícolas constituídas pelas emblemáticas e funcionais mandalas das caiçaras que cercavam as ocas coletivas e um centro sem ocupação e sem dono. Os combates constantes entre tribos - devido a interesses imemoriais e de ocasião - trabalhavam contra toda a possibilidade de uma sólida e sustentável  CONFEDERAÇÂO dos ANTIGOS da TERRA

Em 1812, o autor do Correio Braziliense necessitava fazer ouvidos moucos para esta história antiga da CONFEDERAÇÂO dos TAMOIOS ou a mais recente das MISSÕES. A estratégia era remeter a culpa ao sistema colonial. De outra parte, como Hipólito José da Costa projetava manter a unidade do sistema lusitano, seria um erro flagrante prestar a menor atenção a particularidades e identidades regionais.  A solução era enterrar a identidade brasileira no silêncio em especial em relação ao seu primitivo habitante. Contudo proclamada a Soberania - e Independência do Brasil em relação ao sistema unitário lusitano -  foi na questão indígena que os poetas, os escritores, os músicos e os artistas visuais encontraram fonte inesgotável par escandir e mostrar esta identidade e diferença em relação o resto da cultura lusitana.


Fig. 06 – O barbudo e velho  HANS STADEN (1525-1579), no meio da aldeia. Ele  soube  entender  o sentido do ritual da antropofagia e o transformou de totem da tribo  em tabu coletivo. O totem de que a carne do forte fortalecia as tribo contras os seus inimigos foi aproveitado pra provar   que a carne de um branco e velho iria tornar fraca a tribo e os guerreiros .

O editor do Correio Brazilense unia-se a cultura dos administradores britânicos que agiam por cima e por fora de qualquer outra cultura qu na fosse a sua. No Brasil, antes desta explosão cultural as missões européias, não lusitanas, foram generosas em produzir documentos científicos e artísticos cujo tema era esta primitiva população brasileira.
Os Tamoios, que os portugueses viam como rebeldes confederados aos franceses, permanecem uma imagem profícua para o Brasil. Não apenas  para pensar o nascimento da nação mas, recentemente, inclusive, para  pensar os destinos dos povos indígenas atuais que, aos poucos, encontram  formas de se representar como um “conjunto” e como um “movimento”.

PERRONE – MOISES Beatriz et SZTUTMAN Renato “Notícias de uma certa confederação tamoio” in MANA 16(2): 401-433, 2010 *p. 403


Fig. 07 – Chefe Guaicuru preparando-s para a viagem até a corte do Rio de Janeiro onde foi desenhado por Debret e depois este desenho foi publicado em Paris. Esta tribo havia sofrido a aculturação missioneira e dos bandeirantes

Na mesma época em que o CORREIO BRAZILENSE silenciava o tema do primitivo habitante ameríndio. o francês João Batista Debret abriu o seu olhar, atenção e traço para registrar as abundantes acampamentos de indígenas que se formavam ao redor da corte lusa refugiada no Rio no Rio de Janeiro. Bastava estar atento.
Quant à l'histoire particulière des sauvages, une circonstance heureuse m'en fournit les premiers matériaux : deux jours s'étaient à peine écoulés depuis notre arrivée, que Ton nous fit voir des indigènes Botocoudes récemment amenés à Rio-Janeiro par un voyageur qui me donna la facilité de les dessiner avec soin, en ajoutant à cette complaisance des renseignements aussi vrais qu'intéressants sur les moeurs de ces indigènes, au milieu desquels Il avait vécu. Le hasard me fit ainsi commencer, au sein d'une capitale civilisée, cette collection particulière des sauvages que je devais achever dans les forêts vierges du Brésil.

Os Tamoio ou Tamuja, como os  chama Anchieta, é um cognato de tamo que, em muitas línguas tupi-guarani,  significa “avô”, “homem velho”, e não raro também chefe, líder doméstico, espiritual e/ou político. Entre os Guarani atuais, como salienta Pissolato,  tamoi significa, em princípio, “avô”, mas costuma ser utilizado de modo mais  amplo para se referir a “homens mais velhos, em particular líder p. 415

É interessante perceber que os Iroqueses da América do Norte empreenderam a sua confederação, antes da descoberta da América. As suas cinco nações originais continuam a aglutinar os descendentes atuais. Também foram estudados e descritos pelos jesuítas e cujas obras foram publicadas na Europa que Hipólito não poderia ignorar.


Uma nação pertence a todos, porém a ninguém individualmente. A Confederação dos Tamoios desejava implantar esta lógica. Percebia a necessidade de afirmar este principio diante do sentimento comandado pela cupidez e as ações de  apropriação e de posse individual e singular, que o europeu estava implantando na terras que sempre pertenceram a todos. Terras e bens que inclusive poderiam serem usufruídos pelos europeus, contanto que eles também respeitassem este legados dos seus ancestrais. Principio que os guiou no passado e aos seus descendentes até os dias atuais nos seus toldos e suas reservas.  Os parques nacionais  passaram a constituir curiosidades exóticas e únicas para  a CULTURA OCIDENTAL numa espécie de MUSEU ao VIVO e ao CEU ABERTO.
O espetáculo a CEU ABERTO denunciam, no seu conjunto material, não só os discursos “por cima e  por fora” iluministas requentados. Discursos estrondosos de marketing, de propaganda e de contra propaganda. Discursos cada vez mais estridentes, monótonos e ensurdecedores - de ouvidos e mentes - mas necessários para abafar e silenciar os argumentos e necessidades primárias do poder originário.


Fig. 08 – As figuras de  DACUI e AIRES evidenciam que a tribo da origem da índia não necessitava nada dos comerciantes e da era industrial de outra parte nda tinha de oferecer de atrativo par a mundo industrial. A 29 de novembro de 1952, na igreja da Candelária, no Rio de Janeiro, o sertanista Aires Câmara da Cunha casa-se com a índia Diacuí, do Xingu. O padrinho foi Assis Chateaubriand. Presentes 10.000 pessoas, entre grã-finos, índios e curiosos. O fato, na época, foi registrado pela imprensa de todo o mundo. 


O longo cortejo europeu foi movido pelas mais diferentes motivações nas suas empresas na América face ao seu primitivo habitante. O primeiro conquistador procurou impor a sua lógica e pretendido  direito de “descobridor” sobre os nativos. As legiões de religiosos viam neste ameríndio “almas a conquistar” a qualquer preço. O discurso iluminista abriu caminho ao comerciante da 1º era industrial diante do ‘bom primitiva e sem culpas”, mas cuja cultura e língua mais atraplhavam o negócio imaginado e controlado pelo europeu. No Brasil o positivismo motivou um Marechal Rondon (1865-1958) e no Rio Grande do Sul Carlos Torres Gonçalves (1876-1974) a perceber no índio um ser humano. Eles o denominavam de “irmão selvagem” e com este discurso abriu reservas, toldos e aldeias como peças de um museu ao céu aberto de uma cultura disfuncional para o tempos e as práticas contemporâneos.
Contudo estas motivações possuíam, na prática, o seu  centro na cultura e mentalidade mercantilista, capitalista e da era industrial incipiente do qual o Correio Braziliense era uma das expressões escritas. O ENTE indígena fugia a estas motivações. Restava praticar o silencio e a cegueira intencional para que este  SER ameríndio não fosse percebido muito menos viesses atrapalhar o euro centrismo que se queria hegemônico. O ameríndio não se enquadrava no ente europeu. Este o esquadrinhava  buscando nele um potencial consumidor ou um fornecedor continuado de matéria prima como havia sido o ouro momentâneo da América ou a madeira que deu o nome ao nosso país e que a longo tempo já se esgotara.

FONTES

GAMA, José Basílio – URAGUAI - in

 DEBRET, Jean Baptiste, 1768-1848  Voyage pittoresque et historique au Brésil [...] (Volume 1) ou, Séjour d'un Artiste Français au Brésil, depuis 1816 jusqu'en 1831 inclusivement, époques de l'Avenement et de l'Abdication de S. M. D. Pedro 1er, fondateur de l'Empire brésilien. Dédié à l'Académie des Beaux-Arts de l'Institut de France, par J. B. Debret ..: Paris : Firmin Didot Frères  1834 3 v., v. 1 : il., front., 48 gravs., 1 mapa ; 54,5 x 35 cm Francês

ANCHIETA José 1534-1597 GRAMÀTICA AVANHENGA ART E da GRAM A T I C A   mais falada na costa do Brasil. Padre José de :Ànchieta da Ordem de JESU Impressor Coimbra per Antônio de M«íz em. I $ 9S

Alvar Núñez Cabeza de Vaca (1492-1568)

HANS STADEN (1525-1579)

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