sexta-feira, 13 de junho de 2014

NÃO FOI no GRITO - 094

Em JUNHO de 1814 o GOVERNO do BRASIL era ÓTIMO:

pena que existia o povo...

Jean Baptiste  DEBRET (1768-1848) - Embarque para o sitio de Montevideo em 21 de maio de 1816
Fig.01 – A corte, sentada na sombra, assiste ao desfile dos expedicionários lusitanos que vão reforçar o cerco a cidade de Montevideo. A corte está trajada de luto pela recente morte de Dona Maria I.

No Brasil a distância entre o governo e o seu PODER ORIGINÁRIO sempre foi enorme e continua sendo abissal. Os lusitanos trouxeram  um poder feudal para a sua colônia. Na Europa cada senhor feudal tinha o seu castelo e os seus vassalos próximos, conhecidos e de absoluta confiança. Na colônia brasileira os corneis e os caciques não se entregaram ao trabalho oneroso de levantarem amurados, fossos e ameias. Contudo eles compensaram esta falta de equipamento pela truculência e pela insolência no trato de quem se atrevia a penetrar nos seus enormes latifúndios. Estes latifúndios aos poucos evoluíram para a estrutura municipal e onde coronéis e seus descendentes diretos continuaram e mantiveram o poder feudal.
Jean Baptiste  DEBRET (1768-1848) - Civilizados conduzindo indios prisioneiros índios em Curitiba
Fig.02 – As armas de fogo e o uso dos metais industriais garantiam aos coronéis e aos caciques alinhados com o governo colonial plena autonomia para agir. O limite deste poder  era não agir contra estes interesses coloniais lusitanos.

Este MILITARISMO feudal endêmico explica os fracassos e os vexames da administração municipal lusitana colonial face à primeiras tentativas para implementar a IMIGRAÇÃO no Brasil. Uma administração municipal radicalmente má e apenas voltada para a manutenção de sua frágil e pequena herança ancestral via, em cada imigrante, um potencial concorrente, cultural e tecnicamente mais preparado. O governo colonial central lusitano reinava absoluto sobre estas intrigas municipais. De origem hereditária e se acreditando consagrados e ungidos pelos poderes sobrenaturais. Bastava editar alvarás, decretos e leis. Neste meio tempo se entregar a longos e elaborados rituais entre os quais se ressaltava as de cunho religioso. Com este procedimento a clivagem e a distância entre o governo e o seu PODER ORIGINÁRIO eram abismais.



A imigração açoriana se perdeu nestes latifúndios e sem trazer uma outra forma de pensar, agir e fazer circular o sistema do poder colonial e feudal.

A única forma de abrir uma brecha neste poder feudal seria uma imigração massiva para estabelecer uma forma concorrente de pensar, agir e fazer circular o poder distinto daquela forma colonial e escravagista brasileira.


Refiexoens sobre as novidades deste mez sobre o BRAZIL e estampado no CORREIO BRAZILIENSE, VOL. XII. Nº 72, VOL. XII. No. 73. junho de 1814, Miscelânea pp.916 - 918.


Governo municipal das Provincias no Brazil.


Por occasiaõ de fallarmos nos meios de attrahir população ao Brazil, dos paizes estrangeiros, para o que recommendamos taõ boas leys, e taõ boa execução dellas, que os estrangeiros, desejosos de emigrar para o Brazil, se persuadam, que as suas pessoas, e propriedades seraõ respeitadas; convém repettir aqui, o que por mais de uma vez temos dicto; isto he, a necessidade indispensável de mudar a forma de administração das provincias do Brazil, sem o que nunca se melhorará a sorte dos povos.

Como os exemplos particulares provam, de maneira mais convincente, do que as theorias geraes; adoptamos desde o principio de nosso periódico o systema de narrar factos e nomear pessoas; porque dahi naõ pode provir outro mal, senaõ o ódio desses acusados contra nós, do que naõ fazemos caso; e quanto á verdade, ou justiça das accusaçoens, como sempre nos offerecemos a ouvir as partes, e. admitir as suas defensas, naõ nos dóe a consciência nesta parte; e na verdade parece-nos esta linha de comportamento, pelo menos mais franca, do que nunca será a hipocrisia dos Redactores do Jornal Scientifico, conduzido por um medico degradado por Jacobino, e por outros associados da mesma laia; e protegido pelos fautores do celebre tractado de commercio; reptis aduladores.e assalariados detractores, que promettido de não fazer personalidades, se tem constantemente embaraçado com o Redactor deste Jornal, e com muitos outros indivíduos, a quem alias deviam respeitar, ainda sem olhar para a contradicçaõ de seus escriptos, com a promessa de que não fariam personalidades.

Seguindo pois o nosso systema, e argumentando contra a forma actual de administração no Brazil; dizemos, que o Governo militar, que ao presente está em voga, he péssimo em todo o sentido.
O limite do PODER ORIGINÀRIO do BRASIL era não agir contra estes interesses do PODER COLONIAL CENTRAL. Este poder intervinha com mão de ferro como aconteceu com Calabar (1635), Zumbi dos Palmares (1695) Felipe dos Santos (1720) Tiradentes (1792).  Inclusive este PODER COLONIAL CENTRAL LUSITANAO não tinha o menor pejo em se aliava aos seus arqui-inimigos espanhóis como aconteceu, entre 175 e1756 com a destruição das Missões Jesuíticas. A memoria destas repressões bárbaras permanecia como exemplar no interior de  uma colônia sem comunicação sem comunicação externa.

Porém esta violência e arbítrio eram bem recentes e com repercussões na confiança econômica. Em junho de 1814 começava a ganhar repercussões internacionais. Na medida em que o Brasil se abria para o comercio mundial este começava a sentir este arbítrio em seu comércio com a província do Ceará.    
Chegaram-nos á maõ narraçoens de factos contra o governador do Ceará, Manuel Ignacio de S. Payo, que sò saõ dignos do reynado de um Caligula; e portanto muito impróprios do paternal governo de S. A. R. o Principe Regente, de cujo bom character nos fazemos taõ boa idea, quanto todos os seus subditos tanto da Europa como da America se mostram assaz satisfeitos, e convencidos da rectidaõ de suas intençoens.

Notaremos alguns destes factos do tal Governador.

1°. Inventar legislação sua a respeito de passaportes, para ir de umas terras ás outras no mesmo districto; com indizivel vexame dos povos, e interrupção das communicaçoens mercantis, amigáveis, e de familia; e isto com cláusulas, e circumstancias (principalmente a respeito das mulheres) de uma atrocidade dedespotismo.de que só se acha exemplo em nosso tempo na legislação de Bonaparte.

WEING6ARTNER Pedro 1853-1929 -Acampamento de carreteiros -   Pinacoteca Aldo Locatelli Prefeitura de POA-RS
Fig.03 – As demoradas e perigosas jornadas dos carreteiros que se aventuravam penetrar e atravessar o interior do território brasileiro  são evidenciadas nos registros de Arsène Isabelle. Ele levou 100 dias para fazer, em 1834, o trajeto de São Borja até Rio Pardo. O controle militar era absoluto sobre as naturais da terra e a desconfiança aos estrangeiros deteve Alexandre Humboldt nos limites do território colonial lusitano brasileiro .

2°. Mandar pagar dividas, entre partes, por execução militar, sem provas, ou outra qualquer formalidade de processo judicial.

3°. Obrigar um homem a casar contra sua vontade, pelo alegado crime deseducçaõ, sem outro processo mais que a prizaõ, e execução militar.

4°. Mandar prender um indivíduo, por ter movido a outro um preito em justiça.

5». Soffrer que o seu Secretario leve propinas arbitrarias, por vários actos, que devem ser grátis ex officio.

Estes e outros vexames tem feito fugir a gente da Capitania do Ceará ao ponto, que o termo das povoaçoens de Milagres, villa do Crato e Barra do Jardim, e outros, estaõ quasi desertos; da Serra dos Cavallos, no termo de Icó, sahirain de uma vez quarenta e nove famílias. Tudo o que temos avançado se nos fez constar por papeis authenticos, passados e reconhecidos pelo juízo da Índia, e Mina, em Pernambuco, e outras partes ; por isso falíamos afoitamente. O total das pessoas, que tem fugido desta Capitania.para as de Parahiba, Rio de S. Francisco, e Pernambuco, se calcula em mais de 4.000 3.J m&s.

Deixamos de fallar de inumeráveis outros actos de arbitrariedade igualmente escandalosos; porque o dicto basti para o nosso fim.

Daqui concluímos, reflectiiido no que temos dicto em N". antece dentes sobre os Governadores do Maranhão, &c, que estes vexames dos povos naõ provêm somente das pessoas que se nomeiam para os Governos, mas da forma de administração, que he radicalmente má.

Guilherme LITRAN, -_Guerra dos Farrapos -_A emboscada
Fig.04 – As sedições contra o poder colonial,  e depois imperial, era uma constante. Sedições cujos mentores agiam contra os interesses coloniais lusitanos e depois imperiais. Interesse coloniais e imperiais que se limitava a manter firmemente  o trono - e toda a vida política – o mais distante do PODER ORIGINÁRIO da NAÇÃO. Mentores que sabiam da tradição de truculência deste poder que não tinha dará conta diante de qualquer outro poder fora das fronteiras coloniais.


Quando as colônias do Brazil eram prezidios ou guamiçoens militares, bem se poderia admittir, que os poucos habitantes, que vivessem juncto a elles, fossem governados pelo commandante militar; porque taes habitantes se podiam considerar, como uns quasi vivandeiros do exercito, que convém estejam sugeitos ao despotismo militar do chefe das tropas; porém quando a população tem crescido em numero, riqueza, e consideração, ao pouto de que taes guarniçoens saõ objecto secundario, e mui insignificante, he grande absurdo continuara mesma forma de administração.

Um pay pode com propriedade dar uma dúzia de palmatoadas em seu filho quando criança, por alguma falta, que tenha commettido; mas querer tractallo da mesma forma quando elle chega á idade de 30 annos, he uma inconsequencia que naõ pode ter lugar. O argumento he o mesmo, quando se contempla que a forma de administração do Brazil, agora que elle he um Estado bem povoado, rico, e cheio de habitantes agricultores, he a mesma que éra quando elle constava de meros presídios, e guarniçoens militares.

 S. A. R. deve estar persuadido, que elle naõ conhece os indivíduos para os nomear Governadores; e por tanto ha de por força atender aos que os Secretários de Estado lhe apresentarem; que nenhum se lhe apresenta sem ter protecçoens, ou como lá se diz empenhos; e que essas protecçoens, que serviram para a nomeação, servem ao depois para patrocinar, e occultar os crimes, que elles comettem, principalmente se trazem dinheiro dos seus governos.

WENDROTH, Rudolf Herrmann – militares no RS 1852
Fig.05 – As manobras militares e iminência de guerras necessitava o alinhamento de fazendeiros improvisados em coronéis e de caciques de tribos conferia-lhes plena autonomia para agir. Porém deviam abster-se de arranhar qualquer interesse colonial lusitano.

Quasi todos os homens no Brazil pertencem á tropa, ou de linha ou de milícias, ou de ordenanças; e como o Governador he commandante em chefe das tropas, naõ ha cidadão que possa escapar do seu despotismo, justificado por esta sugeiçaõ militar; ainda quando faltem todos os demais pretextos de jurisdicçaõ. Ora he preciso confessar, que he esta uma existência bem precária, que naõ pôde convidar estrangeiro algum a deixar a sua pátria, para se ir estabelecer no Brazil. Nem digam que estes factos precizam que nos os narremos aqui, para serem sabidos nos paizes estrangeiros, elles saõ assaz conhecidos sem isso; nós só lhe damos publicidade, para que chegue á noticia de quem lhe pôde e deve dar o remédio. Um negociante do Ceará, correspondente de outro negociante Inglez em Londres, de quem recebeo ordem de cobrar uma divida de 4.000.000 de reis, na villa da Fortaleza, foi impedido pelo Governador de instituir um processo judicial, e assim naõ se pode cobrar a divida: taes factos necessariamente haõ de dar aos estrangeiros terrível idea da administração do Brazil.

WEINGARTNER Pedro 1853-1929 - TEMPORA MUTANTUR – MARGS
Fig.06 – Abandonados tanto pelas suas pátrias de origem como aquelas a qual escolheram como sua pátria de destino. O certo é que cedo se deram conta que não tinham a menor chance de retornar sobre os seus passos. De outro não tinham vindo a passeio nesta terra que lhes era estranha em tudo. Restava-lhes apenas a sua cultura, a sua vontade e imensa capacidade de convívio com os seus patriotas, os antigos escravos e os primitivos indígenas.


FONTES BIBLIOGRAFICAS.

ISABELLE, Arsène (1807-1888) – Viagem ao Rio da Prata e ao Rio Grande do Sul- Tradução de Teodomiro Tostes; Introdução de Augusto Meyer [2ª reimpressão] Brasília: Senado Federal,2010 XXXI p + 314 p. (vol. 61- Senado federal)

SAINT- HILAIRE, Auguste (1779-1853) Aperçu d’une Voyage dans l´intérieur du Brésil, la province et les mission du Paraguai.  Paris : Imprimerie da Belin, 1823, 73 p.




FONTES NUMÉRICAS DIGITAIS

CORREIO BRAZIENSE –junho de 1814





INDIOS PRISIONEIROS





Domingos Fernandes CALABAR (1600-1635)




ZUMBI dos PALMARES (1655-1695)




REVOLTA de 1720 de Felipe dos Santos – Minas Gerais




José Joaquim  da SILVA XAVIER – 0 TIRADENTES- 1746-1792




MISSÕES JESUÍTICAS na AMÉRICA do SUL



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Círio SIMON


























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